A existência de jornais, revistas, rádios, canais televisivos e portais de informação disseminados pela dispersa geografia da diáspora lusa, é concomitantemente um sinal evidente do dinamismo das comunidades portuguesas, assim como do papel estruturante que os meios de comunicação social desempenham na sociedade contemporânea ao nível dos modos de vida, dos valores, das opiniões e da visão do mundo que partilhamos.
Não deixa igualmente, no caso da imprensa de língua portuguesa no mundo, de ser um evidente reflexo dos elevados números da emigração lusa, que fruto da falta de oportunidades de emprego leva a que ciclicamente milhares encontrem fora de Portugal a oportunidade que o país não lhes proporcionou.
É neste cenário de geografia global que os órgãos de comunicação social das comunidades portuguesas num mundo em crescente mobilidade desempenham um papel insubstituível e incontornável na promoção da língua, da cultura e da economia nacional no estrangeiro, assim como do pulsar da vida das sociedades em que está inserida.
Com incontáveis dificuldades, várias vezes sem o devido reconhecimento do poder político das pátrias de origem ou de acolhimento, e na maior parte dos casos sobrevivendo graças ao espírito de carolice dos seus diretores, colaboradores, leitores e empresários mecenas, com mais ou menos dificuldades expostas pelas crises económicas, a tudo isto os meios de comunicação social produzidos pelos emigrantes portugueses e seus descendentes vão procurando resistir. Dando um exemplo genuíno de altruísmo e serviço em prol de uma informação de proximidade que constrói pontes entre povos, dilui a saudade e a distância, fortalece a identidade cultural e projeta Portugal no Mundo.
Como assinala a antropóloga Sónia Ferreira no trabalho “A emigração portuguesa e os seus meios de comunicação social”, os “média produzidos pela diáspora são instituições sociais onde podemos ler amplamente como estas identidades se constroem e consolidam”, assim como meios fundamentais “para a compreensão global dos processos migratórios portugueses”.
No entanto, os tempos hodiernos desvendam cada vez mais exemplos da complexidade que constituiu a sobrevivência destas genuínas instituições de cidadania e portugalidade, tendo inclusive algumas delas, no decurso deste ano, fechado portas perante notórias dificuldades financeiras inerentes às cada vez mais escassas receitas publicitárias.
Encontram-se, por exemplo, nesse fim de ciclo, a Revista Comunidades, cuja direção em comunicado divulgado no alvorecer de setembro e intitulado “O fim de mais um projeto de comunicação”, sustentava “damos como encerrado este projeto de comunicação, que vimos trabalhando desde 2014 e totalmente dirigido aos portugueses e luso-descendentes que vivem e trabalham no estrangeiro”.
Pouco tempo depois, e na esteira das mesmas dificuldades, tornou-se público o encerramento de dois conhecidos jornais das comunidades portuguesas na América do Norte. Mormente, o jornal 24horas que terminou 25 anos dedicados às comunidades portuguesas e aos leitores lusófonos nos Estados de Nova Jérsia e Nova Iorque, nos Estados Unidos. E o jornal Sol Português, que servia as comunidades portuguesas no Canadá desde há quarenta anos.
Perante este quadro de crescentes dificuldades, a que se junta à erosão das receitas publicitárias, o acentuado envelhecimento de várias comunidades portuguesas e o enraizamento de uma cultura de confiar nas notícias e revelar interesse por elas, mas de não pagar por jornalismo, urge uma reflexão aprofundada sobre o papel dos meios de comunicação social das comunidades portuguesas.
Uma reflexão que não pode deixar de abranger as seguintes linhas de ação: a desconstrução do paradigma “confia-se nas notícias, mas não se paga por elas”; o reforço de dotação das autoridades nacionais no acesso dos meios de comunicação social das comunidades portuguesas a campanhas de publicidade institucional, essencial para a sustentabilidade financeira das publicações; a incessante procura na credibilidade, rigor e isenção, alicerçada numa aposta decisiva nas competências digitais e nas redes sociais, capaz de atrair e fixar novos públicos como os lusodescendentes.
Uma reflexão que tenha como pano de fundo a ideia basilar do escritor francês Victor Hugo, um dos autores fundamentais da literatura universal: “A imprensa é a imensa e sagrada locomotiva do progresso”.
Autor: Daniel Bastos, Historiador e Escritor.