Nos muros do forte do Bom Sucesso figuram nomes ordenados por ano e ordem alfabética. Estes nomes são de combatentes, soldados com as mais variadas patentes e dos diversos corpos ou ramos militares ou policiais, que morreram em combate em defesa da Nação Portuguesa.
O dia 10 de junho, Dia de Portugal, é pretexto para que colegas de armas e familiares se juntem e lembrem cada um, e todos, que do Memorial os nomes já fazem parte. O encontro nacional de homenagem aos combatentes reúne em Belém, em Lisboa, famílias vindas de todas as parte do país, e mesmo do estrangeiro.
Um encontro que serve, também, referem os organizadores, para que os mais velhos possam transmitir aos mais novos o sentido de Nação e de Pátria, para falarem do Ultramar. Lembrar filhos, irmãos, pais, maridos ou colegas que tombaram, apenas porque ao serviço do seu país lutavam.
Perfilam-se velhos soldados em marcha, ainda que a cadência não esteja alinhada, mas mantêm-se firmes do dever cumprido e de memória viva sobre o passado, e sempre de olhos colocados na linha da frente.
Coroas de flores, cada uma transportada e colocada junto ao monumento por dois soldados, são o símbolo de que os que morreram continuam vivos e parte integrantes das unidades militares ou das organizações policiais a que pertenceram. Um momento simbólico da homenagem aos mortos em combate.
Na cerimónia evocativa aos combatentes o tenente-coronel (na reforma), Brandão Ferreira referiu, no seu discurso, que se reuniam ali “desde há cerca de 25 anos a comemorar o Dia de Portugal honrando os combatentes”, por outro lado “as figuras que se ocupam transitoriamente das cadeiras do poder … estão sempre no outro lado”.
Referindo-se aos políticos, disse que “quanto aos combatentes por norma aos costumes dizem nada”, indicando que foi o motivo que levou as Forças Armadas a “estarem arredadas cerca de três décadas” das comemorações do “feriado nacional”.
E Brandão Ferreira, em tom de pergunta e resposta, disse: “Não somos nós que estamos mal, eles é que se afastaram do trilho certo, da honra, do patriotismo, e do amor a Portugal”.
“Portugal é obra de soldados”, frase de Mouzinho da Silveira, citada por Brandão Ferreira, sobre a qual acrescentou que “passou a estar na moda”, mas que esta frase retratou sempre “uma realidade, pois sem soldados, sem combatentes, não haveria território, … a tal ‘nesga de terra debruada de mar’, no dizer de Torga”.
Sem soldados, sem combatentes, ou no dizer de outros sem a ‘raia miúda’ do povo, ou sem “o tal povo de Eça”, então “não haveria população, não haveria matriz cultural, não haveria segurança, não haveria justiça, não haveria bem-estar, não haveria liberdade”.
Um povo onde se “devem individualizar as mães e as mulheres, pois foram elas que sempre aguentaram a retaguarda”. Assim, “todos nós devemos estar orgulhosos dos nossos combatentes, de quem disse ‘pronto’ quando chegou a hora, quem lutou quando foi possível lutar que não virou a cara aos sacrifícios”.
“Sempre houve e ainda há” os que desertaram do combate ou que traíram a terra que lhe serviu de berço, “deles falam os Lusíadas e não há estátuas, nomes de ruas, séries de televisão, condecorações, prémios, branqueamento da História etc, que possa apagar essa realidade da memória coletiva da nação”.
O tenente-coronel referiu que “o combate não terminou com aqueles que hoje homenageamos”, pois teremos de “guerrear novamente”, dado que o terrorismo não é apenas “uma expressão de lunáticos contemporâneos”.
“Temos pois de nos preparar para os combates do futuro”, dado que “os nossos antepassados não andaram a trabalhar, a lutar, a edificar, a expandir o país desde 1128 para agora estarmos a alienar ao desbarato a nossa soberania, a nossa nacionalidade, a nossa cultura, a nossa gente, o nosso património, e a nossa terra”.
Brandão Ferreira, lembrou que a cerimónia se destina “à exaltação da memória dos combatentes nossos antepassados ou nossos contemporâneos” mas que se destina principalmente “aos que vivem a quem compete receber e passar o testemunho”.
Aos que vivem, mas sobretudo aos mais novos “compete refletir sobre o exemplo dos que caíram e que se sacrificaram sem esquecer a honra enquanto as imperfeições da natureza humana não nos permitem a erradicação da guerra e outras imoralidades na eterna luta entre o bem e o mal”.
Sobre as ‘guerras do Ultramar’, o tenente-coronel, lembrou que “chegamos a manter 230 mil homens em pé de guerra em quatro continentes e três oceanos a combater durante 14 anos, três teatros de operações enormes, distantes entre si, e a então Metrópole”.
A logística só foi possível devido à marinha mercante portuguesa existente na época “sem a qual não poderíamos reagir tão rapidamente nem sustentado este longo período de operações”. Uma situação que hoje não poderia ser sustentável dado que “dos 70 mil navios mercantes existentes no mundo, apenas uma dezena são de armadores portugueses … que nem meio batalhão conseguem transportar”.
Sobre a invasão de Goa, Damão e Diu, pela União Indiana, em 1961, “face à enorme desproporção de forças em presença e à hipocrisia das relações internacionais”, o tenente-coronel lembrou “o subchefe da polícia Aniceto do Rosário, morto em combate, que na iminência de um ataque indiano disse ao governador ‘parta Vossa Excelência descansado que eu não deixarei ficar mal a Bandeira Portuguesa’. Disse e cumpriu”.