Uma equipa internacional liderada por neurocientistas do Centro Champalimaud, em Lisboa, revelou, em estudo publicado hoje, 8 de março, na revista Nature Communications, que níveis de serotonina aumenta a persistência ativa na realização de uma tarefa, mesmo em situações em que não há certeza de que se vai receber uma recompensa.
As conclusões do estudo são de grande importância para os neurocientistas, pois os cientistas conheciam que a serotonina tem múltiplas funções no cérebro, mas perceber o que a substância efetivamente provocava quando os níveis aumentam no cérebro humano, constituía “uma tarefa monumental”.
A serotonina está na base de uma classe de medicamentos antidepressivos, como é o caso do conhecido Prozac. Estes medicamentos “aparentemente funcionam aumentando os níveis de serotonina no cérebro humano.”
Estudos anteriores, ao agora publicado, tem vindo a sugerir que o aumento dos níveis de serotonina torna os animais, incluindo os seres humanos, “mais predispostos a esperar por uma recompensa”, ou seja, “torna-os mais pacientes”. Estes resultados dos estudos “eram compatíveis com a ideia, aceite por muitos, de que a serotonina atua inibindo os comportamentos, isto porque em muitos casos a paciência exige adiar uma ação.”
Agora o novo estudo conclui “que a serotonina promove mais do que uma espera passiva – mais do que a simples paciência”, mas “aumenta a persistência ativa na realização de uma tarefa”. Ora, “ser persistente significa continuar a desempenhar ativamente uma tarefa, mesmo que ela seja desagradável (como fazer os trabalhos de casa), enquanto muitas formas de paciência só exigem disponibilidade para esperar, sem fazer nada.”
Para Zachary Mainen, cientista que liderou o estudo, os resultados podem, ajudar a perceber melhor como tratar a depressão, uma doença em que a serotonina está envolvida. “A diferença entre a paciência e a persistência pode parecer subtil, mas a implicação deste resultado não o é: pode ser a diferença entre ficar na cama, enquanto lá fora a vida continua, ou saltar da cama todos os dias para abraçar a vida.”
Paciência e persistência significam coisas diferentes, mas os estudos anteriores não tinham abordado essa distinção, que agora é tratada no novo estudo. Para isso, Eran Lottem, primeiro autor do estudo publicado, e os outros investigadores envolvidos no trabalho, “desenvolveram uma tarefa que é de facto muito parecida com a situação com que se defrontam os animais quando à procura de comida no mundo real.”
Eran Lottem referiu, citado em comunicado: “Tínhamos algumas pistas que sugeriam que o efeito inibitório da serotonina não era generalizado. Alguns comportamentos não eram afetados pela serotonina”. Mas, acrescentou: “Nunca tínhamos visto um comportamento ativo promovido pela serotonina. Esta é, tanto quanto sei, a primeira vez que um comportamento deste tipo é observado quando os neurónios produtores de serotonina são ativados.”
Os investigadores usaram ratinhos que submeteram a uma tarefa que consistiu “em dar aos ratinhos a escolher entre dois locais para beber, cada um situado numa das extremidades de uma caixa retangular comprida. Num dado momento, apenas um destes bebedouros estava pronto para fornecer água, fazendo com que os ratinhos tivessem de andar de uma extremidade para a outra da caixa para receberem água. Para isso, tinham de bater com o focinho no bebedouro.”
Mas de forma a simular a imprevisibilidade das situações do mundo real, “os cientistas fizeram com que mesmo o bebedouro ativo nem sempre deitasse água. Os ratinhos tinham assim de aprender a tolerar alguns insucessos quando tocavam com o focinho”. O que permitiu aos cientistas medirem a persistência dos animais. Contaram o número de toques que os animais estavam dispostos a dar para obterem água num bebedouro “seco”, ou seja, que tinha deixado de fornecer água.
A seguir os cientistas utilizaram a tecnologia optogenética para estimular os neurónios produtores de serotonina através de impulsos de laser transmitidos por uma fibra ótica implantada no cérebro dos animais.
Os cientistas observaram “que, quando esses neurónios eram estimulados, os animais tornavam-se mais dispostos a tocar com o focinho durante mais tempo, mesmo quando não recebiam água”, referiu Eran Lottem. Desta forma os cientistas puderam verificar que “a serotonina não estava a inibir o seu comportamento, uma vez que, a ser esse o caso, teriam desistido mais cedo de tentar obter água.” Assim, concluíram: “a ativação dos neurónios produtores de serotonina promove a persistência ativa e não meramente a paciência.”