Uma equipa de especialistas internacionais em veterinária e vida selvagem identificou sete rotas por onde as pandemias podem ocorrer e 161 ações a serem tomadas para reduzir o risco do surgimento de pandemias. O estudo conclui que são necessárias mudanças generalizadas na maneira como interagimos com os animais e que soluções que abordam apenas um problema, como é o caso do comércio de animais selvagens, não são suficientes.
Parar as rotas de uma pandemia
A pandemia pelo novo coronavírus, que se acredita ser originária de um animal selvagem, mostrou o enorme dano que uma doença como a COVID-19 pode causar. Têm vindo a ser pedidos novos regulamentos para controlar as interações com animais selvagens, de forma a evitar o surgimento de outra pandemia como a do SARS-CoV-2.
Para a equipa envolvida no estudo as ações bem-intencionadas, mas simplistas, como as proibições completas ao comércio de caça e vida selvagem, ou de consumo de animais selvagens podem não ser completamente concretizáveis e não são suficientes para impedir outra pandemia. Estas medidas são difíceis de implementar, por isso devem ser cuidadosamente planeadas para evitar a proliferação do comércio ilegal ou a alienação e o aumento das dificuldades para as comunidades locais em todo o mundo que dependem de animais selvagens como alimento.
Doenças zoonóticas
As doenças zoonóticas com potencial epidémico também podem ser transmitidas de animais silvestres, como as civetas, e de animais domésticos, como o porco ou a galinha. Neste caso com maiores riscos de ocorrer onde seres humanos e estes animais interagem estreitamente.
O estudo desenvolvido pelos 25 especialistas internacionais considera todas as principais maneiras pelas quais as doenças com alto potencial de transmissão humano para humano podem saltar de animais para humanos (denominadas doenças zoonóticas). Os especialistas referem que lidar com uma mistura tão complicada de fontes potenciais de infeção requer mudanças generalizadas na maneira como os seres humanos e os animais interagem.
“Muitas campanhas recentes concentraram-se em proibir o comércio de animais selvagens, e lidar com o comércio de animais selvagens é realmente importante, mas é apenas uma das muitas rotas potenciais de infeção. Não devemos assumir que a próxima pandemia surgirá da mesma maneira que a COVID-19. Precisamos de agir numa escala mais ampla para reduzir o risco ”, referiu William Sutherland, do Departamento de Zoologia da Universidade de Cambridge, e membro do St Catharine’s College, Cambridge, que liderou o estudo.
De onde pode vir uma pandemia?
As possíveis maneiras de surgir outra pandemia humana incluem: agricultura, transporte, comércio e consumo de animais silvestres; comércio internacional de gado; comércio internacional de animais exóticos para animais de estimação; aumento da invasão humana nos habitats da vida selvagem; resistência antimicrobiana – especialmente em relação à agricultura intensiva e poluição; e bioterrorismo.
Como reduzir os riscos de uma pandemia
Algumas das maneiras de reduzir o risco de outra pandemia são relativamente simples, como incentivar pequenos agricultores a manter galinhas ou patos afastados das pessoas. Outros, como melhorar a biossegurança e introduzir padrões veterinários e de higiene adequados para animais de criação em todo o mundo, exigiriam investimentos financeiros significativos à escala global. A equipa de especialistas encontrou 161 opções para diminuir os riscos de uma pandemia, que incluem:
■ Leis para impedir a mistura de diferentes animais selvagens ou a mistura de animais selvagens e domésticos durante o transporte e nos mercados;
■ Reduzir o contacto entre animais selvagens e de criação ou domésticos (por exemplo, separando áreas de pastagem ou áreas de rega ou cercas para aumentar a biossegurança de animais de criação)
■ Aumentar a mudança para alimentos à base de plantas para reduzir o consumo e a procura por produtos de origem animal;
■ Protocolos de segurança para espeleologia em áreas com alta densidade de morcegos, como o uso de fatos impermeáveis e máscaras;
■ Melhorar a saúde animal nas quintas, limitando as densidades e garantindo altos padrões de acompanhamento veterinário.
“Não podemos evitar completamente outras pandemias, mas há uma variedade de opções que podem reduzir substancialmente o risco. A maioria dos patógenos zoonóticos não é capaz de transmissão sustentada de homem para homem, mas alguns podem causar grandes epidemias. Impedir a sua transferência para seres humanos é um grande desafio para a sociedade e também uma prioridade para proteger a saúde pública ”, referiu Silviu Petrovan, veterinário e especialista em vida selvagem da Universidade de Cambridge e principal autor do estudo.
“Animais selvagens não são o problema – eles não causam o surgimento de doenças. As pessoas é que o fazem. Na raiz do problema está o comportamento humano, portanto, mudar isso fornece a solução”, referiu Andrew Cunningham, vice-diretor de ciências da Zoological Society de Londres e coautor do estudo.
As soluções foram focadas em medidas que podem ser implementadas na sociedade à escala local, regional e internacional. O estudo não considerou o desenvolvimento de vacinas e outras opções de medicamentos médicos e veterinários. Ele não oferece recomendações, mas um conjunto de opções para ajudar os formuladores de políticas e profissionais a pensarem cuidadosamente sobre possíveis cursos de ação.
Todas as espécies de animais: animais selvagens, selvagens em cativeiro e domésticos – foram incluídas no estudo. O foco foi nas doenças, particularmente dos vírus, que poderiam rapidamente tornar-se epidemias através de altas taxas de transmissão de homem para homem, uma vez que o vírus pulasse de um animal para o homem. Excluindo algumas doenças zoonóticas bem conhecidas, como raiva e a doença de Lyme, que requerem transmissão contínua de animais para os humanos.