Para a assinalar o Dia Mundial do Cérebro, 22 de julho, a Federação Mundial de Neurologia (WFN, de World Federation of Neurology) escolheu o tema “Ar Limpo para Saúde do Cérebro” ou “Clean Air for Brain Health”. O objetivo é alertar para a poluição do ar enquanto fator de risco para as doenças degenerativas do sistema nervoso e cerebrovasculares, em especial o AVC. Uma doença que é a principal causa de morte e incapacidade em Portugal.
A Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral (SPAVC) associa-se à campanha da WFN, em Portugal, e aproveita para divulgar as mais recentes evidências e indicações sobre a exposição à poluição atmosférica e a ocorrência de AVC.
“Nos últimos anos, os efeitos da poluição atmosférica na nossa saúde têm sido amplamente estudados. A última estimativa de mortes atribuíveis à poluição atmosférica em todo o mundo é de 12 milhões por ano. Estas mortes são relacionadas com doenças cardíacas, como o enfarte do miocárdio ou insuficiência cardíaca congestiva, doenças pulmonares, doenças oncológicas e, mais recentemente, com doenças neurológicas, nomeadamente o AVC e a demência”, referiu a SPAVC. Pelo que “esta é uma questão emergente que a todos deve preocupar – sociedade e especialistas.”
José Manuel Calheiros, médico, professor catedrático da Universidade da Beira Interior (UBI) referiu: “São complexos os mecanismos que estão na origem da relação entre exposição à poluição atmosférica e ocorrência de AVC, envolvendo uma componente vascular, uma componente ligada ao sistema nervoso autónomo e uma componente relacionada com o aumento da agregação plaquetária.”
Para o professor e investigador da UBI e membro da SPAVC “a poluição está, de facto, a invadir o cérebro os pulmões e, consequentemente, todo o organismo,” como vem concluindo diversos estudos que estabelecem uma relação sólida entre a poluição atmosférica e os efeitos agudos e crónicos sobre os sistemas circulatório e nervoso.
Um estudo publicado em 2017 “analisou os efeitos da poluição a longo prazo numa população de seis países de médio e baixo rendimentos que apresentavam elevados índices de poluição, envolvendo mais de 45 mil participantes”, e concluiu “que por cada aumento de 10 microgramas de partículas poluentes finas (PM2,5) por cada metro cúbico, resulta num aumento de cerca de 13% da probabilidade de ocorrência de um AVC. O estudo revelou ainda que, nestes países, 6,6% da totalidade dos AVC podem ser atribuídos à poluição ambiental.”
A WFN tem chamado a atenção para as conclusões do relatório internacional Global Burden of Disease, que aponta a poluição atmosférica como fator para o aumento do AVC em mais de 30% entre os anos de 1990 e 2013, tendo por base dados de 188 países.
“Esta poluição pode ser proveniente do tráfego automóvel, indústria, centrais de produção de energia, fogos florestais, ao que acresce a poluição dentro de nossas casas e locais de trabalho, proveniente da confeção de alimentos, lareiras, sendo que a mais frequente das causas de poluição do ar interior é o fumo do tabaco o qual coloca em risco o fumador e os que com ele convivem”, alerta o especialista.
Os números do Global Burden of Disease “traduzem-se num risco e peso enormes para a saúde das populações. Apesar das sistemáticas recomendações para reduzir a poluição há muito preconizadas pela Organização Mundial de Saúde e outros organismos, estamos muito longe do que é desejável, pois essas indicações não são cumpridas na maior parte dos países”, referiu José Manuel Calheiros.
Neste contexto o professor da UBI e investigador considera que a sensibilização da população, dos profissionais de saúde e dos decisores políticos para este tema é fundamental, “para que passemos do conhecimento para a ação de Saúde Pública”.