O Parlamento Europeu (PE) considera haver o risco das investigações sobre o assassínio da jornalista de investigação Daphne Caruana Galizia serem comprometidas enquanto o Primeiro-ministro de Malta, Joseph Muscat, se mantiver em funções. Uma resolução do PE foi hoje aprovada por 581 votos a favor, 26 contra e 83 abstenções.
Os eurodeputados manifestaram preocupação com a integridade e a credibilidade das investigações sobre o assassínio de Daphne Caruana Galizia e pelo facto de muitos outros inquéritos sobre casos conexos de branqueamento de capitais e corrupção não terem até agora registado progressos.
Para os eurodeputados qualquer risco, real ou presumido, de comprometer as investigações deve ser excluído por todos os meios, e atualmente “este risco persiste enquanto o Primeiro-ministro, Joseph Muscat, permanecer em funções”.
O PE refere haver casos em que estão alegadamente envolvidos o antigo chefe de gabinete do primeiro-ministro, o ex-ministro do Turismo e outros indivíduos, e por isso insta as autoridades maltesas a porem em marcha as investigações e a fazerem tudo para que se registem progressos.
A eurodeputada Marisa Matias referiu: “Malta é uma porta aberta à corrupção” e a presença de Joseph Muscat no Governo não dá nenhuma garantia que “haja uma investigação imparcial em relação ao assassinato de Daphne Caruana Galizia”.
Para o eurodeputado Paulo Rangel “Daphne Caruana Galizia é uma mártir da liberdade na União Europeia e sinto-me envergonhado porque a Comissão Europeia continua a ser demasiado tímida, o Conselho Europeu permanece silencioso e alguns colegas, nomeadamente do grupo S&D não estão a ter a coragem de dizerem o que diriam se um jornalista tivesse sido assassinado na Rússia, na Turquia ou na China”. O Primeiro-ministro Joseph Muscat deveria prestar um serviço à União Europeia “demitindo-se imediatamente”.
Ameaças graves e persistentes ao Estado de direito
A evolução da situação em Malta nos últimos anos provocou “ameaças graves e persistentes ao Estado de direito, à democracia e aos direitos fundamentais, incluindo a liberdade dos meios de comunicação social, a independência da polícia e do sistema judicial, bem como à liberdade de reunião pacífica”, referiu o PE.
Os eurodeputados relembram as observações da vice-presidente da Comissão Europeia responsável pelos Valores e Transparência, Věra Jourová, que referiu “a incapacidade de Malta para realizar reformas judiciais pode levar à abertura de um procedimento ao abrigo do artigo 7.º” do Tratado, no sentido de se verificar a existência de um risco manifesto de violação grave dos valores europeus.
O PE considera a necessidade de um mecanismo da UE para a democracia, o Estado de direito e os direitos fundamentais, baseado numa análise anual independente, para acompanhar e avaliar o respeito por todos os Estados-Membros dos valores estipulados no artigo 2. º do Tratado da UE, com recomendações específicas por país.
O PE indica ainda na resolução aprovada que o governo maltês deve por termo ao regime de concessão de cidadania e de residência a investidores. Um regime que “consiste na venda efetiva da cidadania da UE”.
Para os eurodeputados a utilização pelos Estados-Membros de regimes de concessão de cidadania e de residência a investidores estrangeiros coloca graves riscos a luta contra o branqueamento de capitais, fragiliza a confiança mútua e a integridade do espaço Schengen, viabiliza a admissão de nacionais de países terceiros com base apenas na riqueza acumulada e não em conhecimentos, competências ou considerações humanitárias.
Prémio Europeu Daphne Caruana Galizia para o jornalismo de investigação
Os eurodeputados congratulam-se com a aprovação pela Mesa do PE da criação de um “Prémio Europeu Daphne Caruana Galizia para o jornalismo de investigação”, que será atribuído anualmente, instando este órgão a ultimar as disposições necessárias com a maior brevidade possível.
Relatório da delegação do PE a Malta
Uma delegação do PE deslocou-se a Malta a 3 e 4 de dezembro para avaliar a situação no país. Os eurodeputados reuniram-se com o primeiro-ministro maltês, Joseph Muscat, o ministro da Justiça, Owen Bonnici, o presidente do parlamento, o procurador-geral e o comissário da polícia, bem como com representantes de ONG, da sociedade civil, jornalistas e familiares de Daphne Caruana Galizia, a jornalista de investigação e ativista anticorrupção assassinada em outubro de 2017.
No seguimento de uma crescente agitação política, o primeiro-ministro maltês anunciou que se irá demitir depois das eleições do novo presidente do seu partido, a ter lugar em 12 de janeiro de 2020.