Mário Dinis-Ribeiro, diretor do Serviço de Gastrenterologia no Instituto Português de Oncologia do Porto e professor catedrático convidado da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, venceu o Prémio BIAL de Medicina Clínica 2018 com o trabalho “Cancro Gástrico em Portugal – Como reduzir a mortalidade por cancro gástrico em Portugal”.
O médico agora distinguido acompanhou, entre 2005 e 2017, cerca de 400 doentes com lesões gástricas malignas ou pré-malignas. A abordagem utilizada permitiu definir novas orientações na deteção e tratamento do cancro gástrico, um dos mais mortíferos em Portugal, sobretudo devido ao diagnóstico tardio e elevada letalidade consequente.
Através da realização de endoscopias foi possível remover lesões de forma minimamente invasiva com uma taxa de sucesso livre de complicações de 80 a 85%. Dos doentes abrangidos, a taxa de mortalidade foi de apenas 1% e nunca por complicações ligadas ao cancro gástrico.
Luís Portela, presidente da Fundação BIAL, destacou “a elevada qualidade científica da generalidade das obras concorrentes e, nomeadamente, das obras premiadas. Hoje, estamos a premiar alguns excelentes profissionais de saúde. A saúde que se faz em Portugal é feita bem. Faz-se muito bem na investigação. Faz-se bem nos cuidados. E também já se faz relativamente bem em termos económicos.”
“Mas a saúde em Portugal tem um enorme potencial de desenvolvimento para servir, cada vez melhor, os interesses de saúde da humanidade, com proveito económico para o país. A Fundação BIAL pretende continuar a contribuir para a investigação e para a divulgação da ciência na área da saúde, sobretudo em Portugal, mas também na Europa e no mundo, referiu o responsável pela BIAL.
O presidente da Fundação BIAL referiu ainda que a farmacêutica tem vindo “a apoiar a ciência que tem beneficiado a humanidade com soluções terapêuticas cada vez mais eficazes, proporcionando melhores condições de vida e maior esperança de vida. A apoiar a saúde que queremos cada vez melhor, cientes de que atualmente tem de haver um grande rigor na utilização dos recursos, para ser possível o percurso inovador e bem-sucedido que tem sido feito no mundo em geral e também em Portugal.”
“Os vencedores desta edição do Prémio BIAL de Medicina Clínica são um exemplo de como a investigação pode melhorar e muito a prática clínica, introduzindo novas guidelines no tratamento de doentes que são aplicáveis em qualquer parte do mundo” concluiu presidente da Fundação BIAL.
O vencedor do Prémio BIAL de Medicina Clínica, Mário Dinis-Ribeiro, que lidera uma linha de investigação clínica no CINTESIS, salientou do seu trabalho o papel da endoscopia na deteção precoce do cancro gástrico ou de lesões percursoras de cancro, substituindo, em muitas situações, a cirurgia. No trabalho apresentado são também explanadas recomendações inerentes aos principais fatores de risco associados ao cancro gástrico: a infeção pelo Helicobacter pylori e hábitos dietéticos errados, incluindo o consumo aumentado de sal e o tabaco.
Mário Dinis-Ribeiro explicou que “os resultados obtidos permitem retirar dois tipos de conclusões e abordagens para prevenir e tratar o cancro gástrico. Por um lado, ao nível da prevenção, é muito importante alertar a população para fatores de risco como o tabaco e o consumo de sal. Por outro, e se queremos diminuir a prevalência do cancro gástrico, devemos evoluir para o tratamento precoce das lesões através da endoscopia alta e evitar que estas evoluam”.
O também Presidente-Eleito da European Society of Gastrointestinal Endoscopy e Presidente da Sociedade Portuguesa de Endoscopia Digestiva realçou que se coloca “em cima da mesa a recomendação do rastreio do cancro gástrico e, tendo analisando o custo-eficácia, aconselhamos que seja feita uma endoscopia em simultâneo com uma colonoscopia. Quando o doente é rastreado ao cancro do cólon e do reto deverá também ser submetido a uma endoscopia, estando desta forma sinergicamente também a rastrear o cancro gástrico”.
Atualmente, o único rastreio recomendado relativamente ao tubo digestivo é o do cancro colorectal, a partir dos cinquenta anos de idade. Mário Dinis-Ribeiro conclui com uma chamada de atenção para “O papel dos decisores em saúde para considerar o adenocarcinoma gástrico na agenda da saúde em Portugal”.
Aproximadamente um em cada 60 indivíduos vem a sofrer de cancro gástrico em Portugal. É estimado que até 2035 se observe um aumento em cerca de 30% no número de novos casos e mortes na Europa. Portugal apresenta a mesma tendência, com um aumento dos atuais 3.018 para 4.082 casos e de 2.285 para 3.172 mortes. Em menos de 20 anos, o cancro gástrico representará a causa de morte para 9 portugueses todos os dias.
O presidente do júri do Prémio BIAL de Medicina Clínica 2018, Sobrinho Simões, salientou “a relevância dos resultados obtidos pela investigação premiada e suas implicações nas ‘guidelines’ nacionais e internacionais de abordagem ao cancro gástrico. Este é um trabalho de grande impacto, num cancro que não tem sido considerado um problema na Europa, mas que tem uma taxa de mortalidade assustadora.”
“Com estes resultados fica demostrado o custo-eficácia da endoscopia digestiva alta na deteção precoce e, consequentemente, no tratamento das lesões, um tratamento, sublinhe-se, minimamente invasivo face à tradicional intervenção cirúrgica. Fica aqui demostrada a importância de apostar na investigação em medicina clínica e de como ela pode ser decisiva na busca de melhores soluções de tratamento para os doentes, mas também na alocação de recursos financeiros” concluiu Sobrinho Simões.
O júri do Prémio BIAL de Medicina Clínica 2018 decidiu ainda atribuir duas menções honrosas no valor de 10 mil euros.
Menções Honrosas
A equipa liderada por Mafalda Bourbon, Coordenadora da Unidade de Investigação e Desenvolvimento do Departamento de Promoção da Saúde de Doenças Não Transmissíveis do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, conquistou uma menção honrosa pelo trabalho “Translational Medicine in Familial Hypercholesterolaemia: from phenotype to genotype”.
Em Portugal, mais de 50% da população tem níveis de colesterol acima dos recomendados pela Sociedade Europeia de Cardiologia. No entanto, 20.000 a 40.000 portugueses têm quase o dobro dos valores recomendados desde o nascimento por terem uma alteração num gene responsável pela remoção do colesterol do sangue, conferindo-lhes um risco muito elevado de sofrerem de uma doença cardiovascular prematura. Esta condição chama-se Hipercolesterolemia Familiar (FH) e é considerada uma das patologias genéticas mais frequentes e a que mais se associa ao aumento do risco cardiovascular. Estima-se que existam aproximadamente entre 15 milhões a 30 milhões de indivíduos com FH no mundo. Destes, menos de 1% foram já identificados.
O Estudo Português de Hipercolesterolemia Familiar (EPHF) foi estabelecido no Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge com o principal objetivo de implementar o estudo molecular da FH em Portugal. Uma rede de 121 médicos de 59 hospitais e clínicas, públicas e privadas, foi constituída para a referenciação de indivíduos com FH durante os últimos 20 anos. Até agosto de 2018, um total de 2.819 indivíduos, de 942 famílias, foram referenciados, incluindo 395 crianças.
O trabalho permitiu melhorar o aconselhamento e adequação do tratamento, levando a uma melhor adesão à terapêutica e a um melhor prognóstico. Os autores salientam que o correto diagnóstico numa criança é particularmente relevante para a decisão da idade de início da terapêutica farmacológica, porque quanto mais cedo ela for tratada, melhor se pode prevenir o aparecimento da doença cardiovascular na idade adulta.
A segunda menção honrosa foi atribuída ao trabalho “Neurosciences of OCD (NoOCD): Towards a Brain Based Clinical” de Óscar Gonçalves, neuropsicólogo e psicólogo clínico, professor catedrático na Escola de Psicologia da Universidade do Minho, e a Ana Castro Fernandes, médica psiquiatra do Hospital CUF-Porto.
Este projeto procurou respostas para melhorar o tratamento de doentes com Desordem Obsessivo-Compulsiva. Uma doença qua afeta 4% da população portuguesa e é uma das mais incapacitantes doenças psiquiátricas, em que o doente é dominado por pensamentos e ideias ameaçadoras (doença, contaminação, acidentes) que tenta controlar através de comportamentos e pensamentos repetitivos (limpeza, organização e rituais diversos). Nos casos mais graves, o doente apresenta elevados níveis de ansiedade e os sintomas ocupam grande parte do quotidiano, interferindo fortemente com a vida profissional, familiar e social.
A comunidade clínica dispõe ainda de uma resposta terapêutica bastante limitada para esta doença, que inclui intervenção farmacológica e psicoterapia. O trabalho de Óscar Gonçalves e Ana Castro Fernandes mostrou que esta doença está associada a uma variedade de alterações cerebrais bem mais extensa do que anteriormente se pensava, possibilitando uma melhor caraterização da doença e uma proposta de tratamento centrada nos processos neuropsicológicos que se encontram alterados.
Para além de uma maior especificidade, o tratamento proposto tem a vantagem de possibilitar uma maior individualização terapêutica, diminuindo a resistência ao tratamento e reduzindo os respetivos custos, com menos consultas, consultas mais breves e maior autonomia na condução do tratamento pelo doente.