Uma equipa de investigação liderada por María Domínguez, do Instituto de Neurociências, um centro comum da Universidade Miguel Hernández (UMH), em Elche, e do Conselho Superior de Investigações Científicas (CSIC), de Espanha, conseguiu provar, pela primeira vez, que um fator importante no desenvolvimento de leucemia linfoblástica infantil aguda é a inflamação.
No estudo, os investigadores prepararam um sistema de triagem para escolher os medicamentos que já estão ser usados para combater processos inflamatórios, e que podem ser eficazes contra este tipo de cancro infantil, e que não tenham efeitos.
A equipa de María Domínguez trabalha há seis anos na procura de medicamentos com menos efeitos colaterais do que os atualmente disponíveis, mas com a mesma eficácia no combate à leucemia linfoblástica pediátrica aguda. O trabalho já está a mostrar a utilidade como conclui estudo publicado na revista científica Cell Reports.
Os investigadores indicam que um projeto conjunto com a Fundação Científica da Associação Espanhola Contra o Cancro (AECC) vai permitir aprofundar a descoberta e examinar outros medicamentos identificados no estudo como clinicamente úteis para doenças inflamatórias.
O estudo até agora realizado pelos investigadores permitiu a descoberta de novos aspetos do tumor e o desenvolvimento de uma plataforma de triagem que vai permitir progredir mais rapidamente na procura de medicamentos mais eficientes e seguros para a doença. Uma plataforma que poderá ser usada para estudo de outros tipos de cancro.
A leucemia linfoblástica aguda é o cancro mais comum entre as crianças e representa aproximadamente 25% de todos os diagnósticos em crianças com menos de 15 anos. Embora a taxa de sobrevivência seja alta, aproximadamente 90%, os efeitos colaterais do tratamento podem durar meses ou anos. Mas cerca de 20% dos casos não melhoram com o tratamento.
A investigadora María Domínguez, que dirige o Departamento de Neurobiologia do Desenvolvimento do Instituto de Neurociências, explicou, citada em comunicado, que “faltava um tipo de rastreio para testar milhares de moléculas e ver o impacto destas no tumor e nas células saudáveis. De forma que se pudesse validar que o que inicialmente se estava a ser observar em animais também estava relacionado à doença em humanos”, a ecrescentou: “Agora que otimizamos o sistema e obtivemos a designada prova de conceito para provar que isso é possível, podemos avançar mais rapidamente na procura de medicamentos mais seguros e eficientes e aplicá-los a outros oncogenes e cancros.”
O gene Notch faz parte de uma das vias de cancro mais complexas e desempenha um papel vital no desenvolvimento normal da maioria dos tecidos do organismo, como a pele, os intestinos ou o sistema imunológico. É por isso que a medicação contra a via Notch vai causar efeitos colaterais em células saudáveis enquanto combatem o tumor, indicam os investigadores no estudo.
Agora os investigadores esclarecem que estão a ser realizados esforços para melhorar a medicação experimental contra Notch e para reduzir os efeitos colaterais, ou para desenvolver estratégias alternativas para esses inibidores.
María Domínguez referiu: “Uma alternativa é otimizar medicamentos que já foram testados em crianças para outros usos, com segurança comprovada, para reutilizá-los em tratamentos contra o cancro. Para isso, um requisito importante era ter um sistema biológico que nos permitisse testar o medicamento de forma rápida, barata e preditiva como a que preparamos, o que também permite ver sua eficácia contra as células tumorais e possíveis efeitos adversos nas células saúdáveis.”
O sistema imunológico está sempre à procura de células danificadas ou anormais, possuindo a capacidade de detetar e destruir as células tumorais incipientes que possam aparecer. No entanto, a inflamação induzida pela fosfoinositídeo 3-quinase, completamente escondida dessas células, dá-lhes uma “capa de invisibilidade”, que impede que o sistema imunológico as detete. Nestas condições favoráveis, a ativação do segundo oncogene, Notch, é suficiente para induzir o desenvolvimento do tumor, explicam os investigadores, e acrescentam que o novo sistema de triagem desenvolvido em laboratório pela equipa de María Domínguez provou que muitos dos medicamentos testados revertem a inflamação.
O estudo indica que há evidências que o tratamento de processos inflamatórios, como a asma, pode ser benéfico no combate à leucemia linfoblástica crónica em adultos. No entanto, dado que as crianças podem ter diferenças no seu sistema imunológico e nas suas características fisiológicas em comparação com os adultos, ainda levará algum tempo para aplicar as descobertas aos pacientes pediátricos.