Pacientes jovens sem fatores de risco para virem a ter um Acidente Vascular Cerebral (AVC) podem ser confrontados com um risco aumentado se contraírem a COVID-19, independentemente de apresentarem ou não sintomas da doença. Cirurgiões da Universidade Thomas Jefferson e do NYU Langone Medical Center, em Nova Iorque, EUA, analisaram pacientes com AVC de 20 de março a 10 de abril de 2020, e observaram que o quadro do AVC era diferente do que costumam ver.
“Estávamos a ver pacientes com 30, 40 e 50 anos com derrames maciços, do mesmo tipo que normalmente vemos em pacientes com 70 e 80 anos”, referiu Pascal Jabbour, chefe da divisão de cirurgia neurovascular e cirurgia endovascular do Vickie & Jack Farber Institute for Neuroscience – Jefferson Health.
“Embora tenhamos que enfatizar que as nossas observações são preliminares e baseadas em observações de 14 pacientes, o que observamos é preocupante”, referiu diz o Pascal Jabbour, e acrescentou: “Os jovens, que podem não saber que têm o coronavírus, estão a desenvolver coágulos que causam derrames graves“.
Os investigadores, incluindo Ahmad Sweid, primeiro autor do estudo publicado na revista Neurosurgery, examinaram 14 pacientes. Oito pacientes eram do sexo masculino, seis do sexo feminino, 50% não sabiam que tinham o coronavírus, enquanto os restantes já estavam a ser tratados devido a outros sintomas da doença quando desenvolveram o acidente vascular cerebral.
O estudo refere:
■ Pacientes com sinais de derrame demoravam a chegar ao hospital por medo de contrair o coronavírus. Há uma pequena janela de tempo em que as consequências do AVC são tratáveis, portanto, atrasos podem ser fatais.
■ A taxa de mortalidade nesses pacientes com AVC é de 42,8%. A mortalidade típica por acidente vascular cerebral é de cerca de 5 a 10%.
■ 42% dos pacientes com AVC com coronavírus estudados tinham menos de 50 anos. A maioria dos casos, mais de 75% de todos os casos nos EUA, ocorre em pessoas com mais de 65 anos.
■ A incidência de coronavírus na população de AVC, abrangida pelo estudo, foi de 31,5%.
■ Os pacientes observados tiveram derrame em grandes vasos, nos dois hemisférios do cérebro e nas artérias e veias do cérebro – todas essas observações são incomuns em pacientes com derrame.
A COVID-19, que é considerada uma doença dos pulmões, está a causar coágulos sanguíneos que levam a uma maior incidência de derrame? Os investigadores mostraram que o coronavírus entra nas células humanas através de um ponto de acesso muito específico – uma proteína nas células humanas chamada ACE2. Mas o coronavírus agarra-se a essa proteína e usa-a como porta de entrada para a célula, onde se pode replicar. Nem todas as células têm a mesma quantidade de ACE2. Essa proteína é muito abundante nas células que revestem os vasos sanguíneos, o coração, os rins e, é claro, os pulmões. Pascal Jabbour e colegas especulam que o vírus possa estar a interferir na função normal desse recetor, que controla o fluxo sanguíneo no cérebro, além de o usar como um ponto de entrada para a célula.
Outra possibilidade é que a inflamação dos vasos sanguíneos, causando vasculite com lesão das células que revestem o lúmen do vaso, chamada endotélio e causem micro trombose em pequenos vasos.
“As nossas observações, embora preliminares, podem servir como um aviso para o pessoal médico nas linhas de frente e para todos os que estão em casa”, referiu Pascal Jabbour. “O AVC está ocorrer em pessoas que não sabem que têm COVID-19, bem como naquelas que se sentem doentes por causa das infeções pelo Coronavírus. Precisamos estar vigilantes e responder rapidamente aos sinais de derrame”.