“Tal como um coreógrafo pode começar a criar a partir de uma peça musical, eu decidi começar a partir de um quadro de Bosch. E tal como um coreógrafo pode escolher cingir-se a uma partitura musical (ou não), eu decidi cingir-me ao quadro de Bosh, ao seu espírito. A alegria de nos curvarmos diante de uma obra-prima!”, Marie Chouinard 2016.
Após um longo percurso iniciado em 1978, em que se dedicou à criação de peças a solo, Marie Chouinard funda, em 1990, a sua companhia. Logo no seu primeiro trabalho, Les Trous du Ciel, de 1991, e no seguinte, de 1993, The Rite of Spring, com música de Stravinski, ficam expostas as preocupações, os interesses e as experiências que irão marcar uma linguagem muito pessoal.
Nesta, a representação do corpo humano vai ganhando múltiplas dimensões na sua relação com a dinâmica do gesto, recorrendo ao vídeo, à voz, à poesia visual, a próteses (como em Body-remix / Goldberg-variations, de 2005), à manipulação em tempo real de som e imagem. Chouinard lança mão destas experiências artísticas como hipóteses de descoberta do “paradoxo da vida, na qual a beleza e a violência podem ocorrer ao mesmo tempo”.
Nesta peça a partir do Jardim das Delícias, de Bosch, Chouinard procede a uma leitura virtuosa da pintura, em que a história da humanidade parece atravessar os corpos dos bailarinos, pondo em evidência o limite da representação figurativa nos movimentos coreográficos.