A partir deste mês de abril, que é o início do ano académico, na Índia, a Teoria de Evolução de Charles Darwin deixa de constar nos livros escolares de ciências, por decisão do National Council for Education, Research and Training (NCERT) do Governo indiano.
Os professores de ciências na Índia estão, no entanto, a pedir ao Governo que recoloque o conteúdo sobre a evolução darwiniana que tinha sido decido remover dos livros de ciências, com o pretexto de aligeirar a carga de estudo dos alunos após a pandemia de COVID-19.
A teoria do naturalista inglês do século XIX, Charles Darwin, é centrada no conceito de que as espécies se adaptam e evoluem ao longo do tempo através de um processo de seleção natural. A abordagem a esta teoria é considerada pelos professores como fundamental para a compreensão do mundo biológico.
O apelo aberto ao Governo, divulgado em 22 de abril de 2023, e assinado por centenas de importantes cientistas e professores de ciências, enfatiza a relevância da teoria de Darwin, referindo: “Os princípios da seleção natural ajudam-nos a entender como qualquer pandemia progride ou por que certas espécies se extinguem, entre muitas outras questões críticas”.
Para o cientista T. V. Venkateshwaran, do Vigyan Prasar, órgão do Departamento de Ciência e Tecnologia que tem como missão popularizar a ciência, referiu que as exclusões de conteúdos são sintomáticas da maneira como a educação científica é tratada na Índia.
“Assuntos e tópicos são adicionados ou excluídos de livros didáticos sem referência a evidências de psicologia educacional ou educação científica”, referiu o cientista ao SciDev.Net. “Então, quando há um clamor de que os livros didáticos são pesados, especialmente depois da COVID, as exclusões são feitas aleatoriamente.”
O cientista acredita que a educação científica deve ser sobre a comunicação de conceitos-chave sobre o mundo por meio da ciência moderna. “Caso contrário, estaremos a viver com perceções do século 14 que podem gerar atrito e levar à violência”.
“O projeto do genoma humano, por exemplo, mostrou que a humanidade é uma só – puxou o tapete das ideias divisivas de raça e casta. Além disso, a evolução aponta para a interconexão entre todos os seres vivos do mundo”, esclareceu o cientista.
As objeções à teoria da evolução pelo partido pró-hindu Bharatiya Janata foram divulgadas pela primeira vez em 2018, quando Satya Pal Singh, então ministro de Estado do Ministério da Educação, declarou no Parlamento que “ninguém, incluindo nossos ancestrais, por escrito ou oralmente, disse ter visto um macaco se transformando em homem”.
Para Satya Pal Singh “a teoria de Darwin está cientificamente errada”, e por isso “é preciso mudar os currículos das escolas e faculdades”. No entanto, as academias de ciências da Índia emitiram uma declaração conjunta referindo: “Seria um passo retrógrado remover o ensino da teoria da evolução dos currículos escolares e universitários ou para diluir isso oferecer explicações não científicas ou mitos” e “a teoria da evolução pela seleção natural, conforme proposta por Charles Darwin e desenvolvida e estendida posteriormente, teve uma grande influência na biologia e na medicina modernas e, na verdade, em toda a ciência moderna. É amplamente apoiada em todo o mundo.”
A oposição na Índia ao darwinismo é semelhante ao problema da ortodoxia cristã com a ideia de que os humanos evoluíram de bípedes semelhantes a macacos, em vez da ideia bíblica de que Deus criou o homem à sua própria imagem, refere Raghunandan, membro da All India Peoples Science Network e o Delhi Science Forum.
“Historicamente, nunca houve qualquer conflito entre a ortodoxia religiosa hindu e a teoria da evolução, simplesmente porque nunca houve uma visão ortodoxa do criacionismo até que os devotos do Hindutva, uma versão politizada do hinduísmo, começaram a propagar sua própria interpretação da mitologia hindu e lendas”, disse Raghunandan.
De acordo com Raghunandan, a mitologia hindu sustenta que a divindade Vishnu desce à Terra como um “avatar” sempre que a ordem cósmica é perturbada. Vishnu primeiro desceu como um peixe, depois como uma tartaruga, um javali, meio homem meio leão, um anão, como um deus guerreiro e finalmente como Krishna, um precetor.
“Enquanto a mitologia hindu vê os avatares como estágios de consciência, os cânticos hindutva os interpretam como uma teoria da evolução muito anterior a Darwin”, explicou Raghunandan.
A ortodoxia islâmica também desaprova o darwinismo e entre os países que baniram completamente a teoria estão a Turquia, Arábia Saudita, Omã, Argélia e Marrocos. O Líbano removeu a evolução do currículo, enquanto na Jordânia a disciplina é ensinada dentro de uma estrutura religiosa.