Ao percorrermos o país vemos que muitas fontes e fontanários nas estradas, aldeias e vilas estão secos e que os rios, ribeiras e lagos têm vindo a secar nos últimos 50 anos. Verificamos que a quantidade de água tem diminuído assustadoramente, indicou João Santos, investigador e especialista em Ciências Geofísicas da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD).
Para o investigador as alterações climáticas, com a consequente escassez de chuva, estão a ter efeitos particularmente graves em Portugal, pelo que há medidas urgentes que se impõem, seja ao nível da gestão da água, seja ao nível das práticas agrícolas, sob pena de o país ficar em condições comparáveis ao Norte de África.
João Santos referiu: “Este ano está a ser particularmente grave, pois a precipitação durante a primavera ficou muito abaixo da média, não é expectável que chova muito mais no verão, e, chegando ao outono, que água disponível iremos ter?”,
O investigador alertou que “se as alterações climáticas produzissem efeitos apenas ao nível do aumento das temperaturas, desde que continuasse a chover ou passasse a chover mais, como acontece nos países do centro e norte da Europa, que vão ter climas mais quentes, mas mais chuvosos, não se colocaria o problema com esta premência, pois, havendo água, em último recurso até poderíamos ter culturas alternativas, oriundas de regiões subtropicais e tropicais. O problema é que, se o nosso clima se vai tornar não só mais quente, mas também mais seco, semelhante ao que temos hoje no Norte de África, não haverá muitas alternativas, e isso é uma ameaça muito séria que temos de ter já em conta.”
Em face da situação João Santos considera que devem ser tomadas medidas urgentes: “No caso da viticultura há necessidade de começar a planear medidas de adaptação, que passam por uma seleção mais criteriosa das castas que cultivamos, quando possível através de uma seleção de clones menos exigentes em água, que suportem melhor o stress hídrico e o stress térmico, mas também pela seleção do próprio microclima onde vamos implantar as vinhas novas”.
O investigador acrescentou: “Por outro lado, terá de se analisar até que ponto vai ser viável ter vinha em zonas como, por exemplo, a margem esquerda do Guadiana, que são zonas já hoje com elevada aridez, onde daqui a 50 anos poderá ser impossível ter viticultura, a não ser que se regue a vinha de forma sistemática, e aqui colocam-se várias questões: onde está essa água para a rega? O Alqueva será suficiente? Será economicamente viável?”
Outras medidas urgentes, indicou o investigador da UTAD, passam por “repensar a gestão da pouca água que temos, começando por controlar muito bem os consumos públicos e provados de água, que são com frequência exagerados”, mas também repensar a questão das hidroelétricas. “Portugal não é um país com grande futuro em termos de produção hidroelétrica, devendo apostar-se mais na fotovoltaica”, defendeu o investigador.
Mas há depois os fogos rurais que consomem imensa água em Portugal, lembrou João Santos, e acrescentou: “Vimos no ano passado o problema da cidade de Viseu, que ficou sem água para as pessoas consumirem porque se gastou quase toda a água disponível no combate aos incêndios”, e a gestão da água na agricultura terá de ser repensada.
“Não podemos ter uma rega de abundância, mas uma rega planeada com recurso a tecnologias de precisão. Globalmente, teremos de repensar uma nova sociedade em que haja muito menos desperdício de água, por exemplo em regas de relvados, hortas e jardins, na consciência de que no futuro vamos ter cada vez menos água” concluiu o investigador da UTAD.