“Neste dia que comemoramos os portugueses, estejam eles onde estiverem, comemoramos um coletivo” referiu Sobrinho Simões no início do seu discurso no Dia de Portugal, e acrescentou que é “um povo com caraterísticas genético-culturais muito sui generis”.
“Não há genes portugueses”, afirmou. No entanto, “existem doenças transmitidas por genes alterados que surgiram em portugueses” e que “espalharam pelo mundo” doenças, como a “doença dos pezinhos, que hoje é possível encontrar no Japão, na Irlanda e em muitos outros locais, mais ou menos recônditos da Terra”.
Outra doença “a doença Machado-Joseph, conhecida popularmente por doença do tropeção, iniciada na Ilha das Flores”, nos Açores, “e levada depois por emigrantes, nos seculos XIX e XX, para a América do Norte e o Brasil”, e recentemente uma “alteração genética causadora de cancro da mama hereditário”, que surgiu numa família portuguesa mas que “hoje não só existe em Portugal como em França.”
Não são os genes alterados que caracterizam os portugueses, indicou Sobrinho Simões, mas “o que nos caracteriza é termos uma mistura notável de genes com as mais variadas origens, e se eu tiver que identificar alguma coisa que seja único ou quase único entre nós é essa mistura genética”.
Para Sobrinho Simões, patologista, investigador e fundador do Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto (IPATIMUP), a historia sobre os movimentos do ‘homem moderno’ saído de África, deveria levar a uma grande homogeneidade dos genes dos portugueses, devido à posição geográfica do país, no entanto não é o caso, pois “somos de uma extraordinária diversidade genética”.
O patologista explicou que a nossa diversidade genética deve-se a termos “incorporado ao longo de séculos, judeus e berberes vindos de Espanha e do Norte de Africa, porque nos misturamos com árabes, porque tivemos a escravatura dos povos de África Subsariana no nosso país e nas colónias” durante centenas de anos.
Mas a diversidade genética têm ainda outras origens, dado que “fomos através do mar para tudo quanto era sítio, na África, na Ásia e na América do Sul, e deles voltamos com filhos, e sobretudo com filhas”. Do Brasil e de África vieram sobretudo jovens mestiças “que incorporamos nas nossas famílias e nas nossas sociedades, mais do que rapazes, e é assim que se compreende que a população portuguesa tenha grandes percentagens de diversas linhagens genéticas, sobretudo de origem materna.”
Os genes foram sendo incorporados e ao mesmo tempo a “incorporação de genes foi acompanhada pela incorporação das respetivas culturas, criando uma sociedade de gentes muito variadas, de comportamento bastante plástico, tolerante em termos religiosos, avesso aos extremismos pseudoidentitários que irrompem um pouco por todo o mundo.”
Portugal possui “ainda hoje meio milhão de portugueses que se exprime mal, em termos de escrita”, mas “apesar disso, temos dado passos de gigante na educação, na saúde, na ciência e na inovação”, e em “alguns destes domínios somos já competitivos a nível internacional.”
Sobrinho Simões referiu que “temos também de continuar a apostar, mas a apostar a ‘sério’ na educação a todos os níveis, usando a sabedoria chinesa que diz: Quem quer ter colheitas no ano seguinte semeia, quem quer resultados a dez anos planta árvores, mas aqueles que apostam mesmo no futuro a cem ou mil anos o que fazem é ensinar, educar, formar.”
Assim, seguindo a sabedoria chinesa, “precisamos de apostar nas pessoas, e precisamos de associar essa aposta à centralidade do trabalho, e à sua dignificação”, e sermos “exemplares de cima para baixo na organização social e na seleção das lideranças. O privilégio tem de ser acompanhado de responsabilidade.”
Assim, graças “às nossas circunstâncias temos todos os ingredientes, mas todos, desde os genéticos e os ambientais aos socioculturais e tecnológicos para aproveitar, pela positiva, os tempos difíceis que se vivem na Europa e no Mundo. Os nossos netos e os nossos bisnetos não nos perdoarão se desperdiçarmos a oportunidade.”