Baixas doses de radiação, o equivalente a três tomografias, que são consideradas seguras, dão às células capazes de produzir cancro uma vantagem competitiva sobre as células normais, em tecidos saudáveis. A conclusão é de um estudo de investigação de cientistas do Wellcome Sanger Institute e da Universidade de Cambridge.
A equipa de investigadores estudou os efeitos de baixas doses de radiação no esófago de ratos, e descobriu que baixas doses de radiação aumentam o número de células com mutações em p53, uma mudança genética bem conhecida associada ao cancro. No entanto, também verificaram que os ratos que recebiam um antioxidante antes da radiação tinham um aumento no crescimento de células saudáveis, que ocupavam o tecido e substituíam as células mutantes p53.
Os resultados do estudo publicados no dia 18 de julho na “Cell Stem Cell” indicam que baixas doses de radiação promovem a disseminação de células capazes de produzir cancro em tecidos saudáveis, pelo que os investigadores recomendam que esse risco seja considerado na avaliação da segurança da radiação.
Todos os dias estamos expostos a várias fontes de radiação ionizante, incluindo radiação natural do solo e das rochas, e importantes procedimentos médicos, como tomografia computadorizada (TC) e raios-X. Pelo que o estudo também oferece a possibilidade de desenvolver medidas preventivas não-tóxicas para reduzir o risco de desenvolver cancro, através do reforço das células saudáveis para superar e erradicar células capazes de produzir cancro.
Baixas doses de radiação, como quando somos submetidos a equipamentos de imagens médicas. Estas doses de radiação são consideradas seguras, pois causam poucos danos ao ADN e, aparentemente, um efeito mínimo na saúde a longo prazo. Até agora não eram conhecidos quaisquer efeitos da exposição a baixos níveis de radiação, pelo que o verdadeiro risco associado a baixas doses de radiação tem sido difícil de determinar e conhecer.
Estudos anteriores mostraram que os nossos tecidos normais, como a pele, são campos de batalha em que células mutantes competem por espaço contra as células saudáveis. Todos nós temos células mutantes capazes de produzir cancro em tecidos saudáveis, incluindo aquelas com mutações p53, que aumentam em número à medida que envelhecemos, mas muito poucas acabam por formar cancro.
Neste novo estudo, os investigadores mostram que baixas doses de radiação favorecem as células mutantes capazes de produzir cancro no esófago. Os investigadores submeteram os ratos a uma dose de 50 miligramas de radiação, equivalente a três ou quatro tomografias computadorizadas, em consequência as células mutantes p53 espalharam-se e superaram as células saudáveis.
David Fernandez-Antoran, do Wellcome Sanger Institute, e primeiro autor do estudo, referiu: “Nossos corpos são um conjunto de ‘Game of Clones’ – uma batalha contínua pelo espaço entre células normais e mutantes. Nós mostramos que mesmo doses baixas de radiação, semelhantes a três exames de TC, podem aumentar as hipóteses de ganharem as células mutantes capazes de produzir cancro. Descobrimos um potencial risco adicional de cancro como resultado da radiação, que precisa ser reconhecida”.
Os investigadores administraram a outro grupo de ratos um antioxidante de venda livre, o N-Acetyl Cysteine (NAC), antes de os exporem aos baixos níveis de radiação, tal como no caso do outro grupo, e descobriram que o antioxidante deu às células normais o impulso necessário para superar e erradicar as células mutantes do p53.
No entanto, também verificaram que só a administração do antioxidante, sem exposição à radiação, não ajudou as células normais a combater as células (clones) mutantes.
Kasumi Murai, do Wellcome Sanger Institute, e coautora do estudo, referiu: “Dar aos ratos um antioxidante antes de expô-los a baixas doses de radiação deu às células saudáveis um impulso extra necessário para lutar contra as células mutantes, no esófago, e fazê-las desaparecer. No entanto, não sabemos o efeito dessa terapia noutros tecidos”, para já “o que sabemos é que nas pessoas, de acordo com outros estudos, o uso prolongado de antioxidantes por si só não é eficaz na prevenção do cancro”.
Phil Jones, do Wellcome Sanger Institute e MRC Cancer Unit, da Universidade de Cambridge, e principal autor do estudo, referiu: “Os procedimentos de imagens médicas usando radiação, como tomografia computadorizada e raios-X, têm um nível muito baixo de risco – tão baixo que é difícil de medir. Esta investigação está a ajudar-nos a entender mais sobre os efeitos de baixas doses de radiação e os riscos que ela pode acarretar, mas são necessárias mais estudos para entender os efeitos nas pessoas.”
A equipa de cientistas sugere que esta investigação também destaca a possibilidade de serem desenvolvidas terapias para prevenir o cancro. Ao aumentar as células saudáveis, elas eliminam as células capazes de produzir cancro, sem nenhum efeito colateral tóxico para o paciente.