Análises que foram mandadas realizar pela Plataforma Transgénicos Fora (PTF) em colaboração com o Detox project mostraram “níveis inesperados e absolutamente assombrosos de glifosato”, referiu a PTF em comunicado.
O glifosato (mais conhecido por Roundup) é o pesticida químico sintético mais usado na agricultura portuguesa, “e até agora o mais ignorado”, dado que “há pelo menos dez anos que não se conhece qualquer análise oficial à sua presença em alimentos, solo, água, ar ou pessoas”.
O glifosato é usado, para além da agricultura, por muitos municípios por todo o país para controlo das ervas nas ruas, praças e caminhos urbanos. Uma aplicação que representa “um potencial de contaminação generalizado que até agora tinha ficado por testar”.
Anualmente são vendidas em Portugal “mais de 1600 toneladas de glifosato”, um químico que a Organização Mundial de Saúde indica ser “provavelmente carcinogénico em humanos e demonstradamente carcinogénico em animais de laboratório”.
O Ministério da Agricultura mantém um plano anual de monitorização em alimentos que testa a presença de mais de 300 resíduos de pesticidas, mas “o glifosato tem sido excluído das análises”, da mesma forma as entidades fornecedoras de água de consumo executam análises periódicas, mas o glifosato não consta da lista de substâncias a serem detetadas.
As análises em 26 voluntários portugueses mostraram que o glifosato estava presente em 100% das análises efetuadas à urina. “Na Suíça, em 2015, uma iniciativa equivalente tinha detetado glifosato em apenas 38% dos casos e, em 2013, num outro levantamento realizado pela associação Amigos da Terra em 18 países europeus, estavam contaminadas 44% das pessoas”.
No que se refere a valores de glifosato, o comunicado da PTF indica que na urina dos portugueses testados, a média foi de 26.2 ng/ml. Já o “estudo ‘Urinale 2015’, que abrangeu mais de 2000 alemães, encontrou uma média de apenas 1.1 ng/ml”.
Verifica-se, assim, que o valor de glifosato detetado em análises à urina é nos alemães cerca de 20 vezes menos do que nos portugueses. O valor mais alto detetado na Alemanha foi de 4.2 ng/ml, enquanto os valores nos portugueses variaram entre 12.5 e 32.5 ng/ml.
Como referência, a PTF indica que de acordo com a Diretiva da Qualidade da Água, “na água de consumo o glifosato não pode ultrapassar os 0.1 ng/ml. Isto significa que a quantidade de glifosato agora detetada, se estivesse em água da torneira, contaminaria essa água 260 vezes acima do limite máximo legal!”.
A PTF esclarece também que “os valores acima de 20 ng/ml constituem, face à literatura disponível, as maiores concentrações jamais medidas em pessoas sem exposição profissional”.
O quadro de resultados das análises mostrou que os “três voluntários mais novos (com idades entre os 7 e os 19 anos) apresentaram um valor médio mais elevado (26.7 ng/ml) que o grupo global, uma desproporção que também foi identificada no estudo alemão”.
Alguns alimentos foram também objeto de análise, o caso de trigo (em grão e em farinha) e aveia em grão e o leite. O leite foi o único alimento em que a análise não detetou glifosato. Na aveia os valores foram de 10 ng/g (nanogramas por grama) e o trigo não processado de 43 ng/g.
A farinha branca ‘tipo 55’ apresentou o valor de 46 ng/g, o que permite referir “que o glifosato não se limita ao revestimento exterior”. Dados que podem indicar que “o glifosato pode estar a entrar regularmente na alimentação dos portugueses”.
Na literatura científica existem estudos publicados que estabelecem uma ligação entre o glifosato e o cancro, bem como a “efeitos teratogénicos (defeitos de nascimento), desregulação hormonal, toxicidade hepática e renal e até autismo”.
“Mas a toxicidade do glifosato não é ainda um facto científico consensual e estabelecido”, havendo mesmo alguns cientistas que discordam das eventuais ligações entre o glifosato e as doenças, “nomeadamente os que têm algum tipo de ligação à indústria”.