“Não há razão para fingir que este é um dia feliz, nem em Bruxelas, nem em Londres. Afinal, a maioria dos europeus, incluindo quase a metade dos eleitores britânicos, deseja que fiquemos juntos e não nos separemos. Quanto a mim, não vou fingir que estou feliz hoje”, afirmou Donald Tusk, Presidente do Conselho Europeu, após ter recebido a notificação da primeira-ministra Theresa May, desencadeando o artigo 50 e formalizando o início das negociações de retirada do Reino Unido da União Europeia.
Donald Tusk acrescentou que, “paradoxalmente, há também algo positivo no Brexit”, dado que o Brexit fez “a comunidade de 27, mais determinada e mais unida do que antes”. Agora o Presidente do Conselho e a Comissão têm “um forte mandato para proteger os interesses dos 27”.
Mas o que se segue a partir agora? Como se desenvolve o processo que conduz à saída do Reino Unido de Estado-Membro da União Europeia. De forma sucinta colocamos algumas questões e respostas sobre o desenrolar do processo.
O que diz o artigo 50 do Tratado da União Europeia?
O artigo 50 do Tratado da União Europeia define o procedimento que permite a um Estado-Membro retirar-se da União Europeia, se o desejar. Foi introduzido pela primeira vez pelo Tratado de Lisboa em 2007.
Como é que um Estado-Membro pode acionar a aplicação do artigo 50?
O Estado-Membro deve notificar o Conselho Europeu da sua intenção de se retirar da União. Não existem requisitos específicos no que respeita à forma desta notificação.
O que acontece quando o artigo 50 foi acionado?
O acordo sobre as condições de saída é negociado nos termos do artigo 218.º, n.º 3, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
Primeira etapa
Um Conselho Europeu extraordinário será convocado pelo Presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, que terá lugar no dia 29 de abril.
O Conselho Europeu adotará, por consenso, um conjunto de orientações sobre a retirada ordenada do Reino Unido da União Europeia. Estas orientações definirão os princípios gerais que a UE defenderá nas negociações, com base no interesse comum da União Europeia e dos seus Estados-Membros.
Segunda etapa
Após a adoção das orientações, a Comissão apresentará muito rapidamente ao Conselho uma recomendação com vista a iniciar as negociações. Esta recomendação será aprovada pelo Colégio dos Comissários, muito provavelmente numa reunião extraordinária, dependendo da data do Conselho Europeu.
Terceira etapa
O Conselho terá de autorizar o início das negociações adotando um conjunto de diretrizes de negociação com base numa maioria qualificada (72 % dos 27 Estados-Membros, ou seja, 20 Estados-Membros que representem 65 % da população da UE-27).
Uma vez adotadas as diretrizes, o negociador da União, designado pelo Conselho, será mandatado para encetar negociações com o Estado-Membro que se retira.
Como é celebrado o acordo que estabelece as condições de retirada?
As negociações sobre a retirada ordenada têm de estar concluídas no prazo de dois anos a contar do momento em que o artigo 50 é acionado. Se não for alcançado um acordo durante este período, os Tratados deixam de ser aplicáveis ao Estado Membro em causa.
No final do período de negociação, o negociador da União apresenta uma proposta de acordo ao Conselho e ao Parlamento Europeu, tendo em conta o contexto da futura relação entre o Reino Unido e a UE.
O Parlamento Europeu deve aprovar o acordo por maioria simples dos membros que o compõem, incluindo aqueles que representam o Reino Unido.
O Conselho conclui o acordo deliberando por uma maioria qualificada suficientemente representativa.
O Reino Unido deve igualmente ratificar o acordo segundo os seus próprios procedimentos constitucionais.
Então quanto tempo resta para as negociações propriamente ditas?
As negociações terão uma duração de cerca de 18 meses (de inícios de junho de 2017 a outubro/novembro de 2018).
Quem negociará em nome da União Europeia?
Os Chefes de Estado ou de Governo dos 27 Estados-Membros da UE convidaram o Conselho a designar a Comissão Europeia como negociador da União e congratularam-se com a nomeação de Michel Barnier como o principal negociador pela Comissão.
A Comissão Europeia, enquanto negociadora da União, e Michel Barnier, enquanto principal negociador pela Comissão, deverão informar sistematicamente o Conselho Europeu, o Conselho e as suas instâncias preparatórias.
Michel Barnier manterá o Parlamento Europeu informado, de forma exaustiva e regular, ao longo das negociações.
Evidentemente, os Estados-Membros serão estreitamente envolvidos na preparação das negociações, de modo a dar orientações ao negociador da União, e na avaliação dos progressos realizados. Para o efeito, será criado no Conselho um grupo de trabalho específico, com um presidente permanente, a fim de assegurar que as negociações serão conduzidas em conformidade com as orientações do Conselho Europeu e as diretrizes de negociação do Conselho.
O Conselho Europeu continuará a acompanhar permanentemente esta questão e, se necessário, atualizará as suas orientações durante as negociações.
Como decorrerão na prática as negociações? Qual será a língua utilizada? Com que frequência ambas as partes se reunirão?
As questões práticas, como o regime linguístico e a estrutura das negociações, serão aprovadas conjuntamente pelos negociadores da UE e do Reino Unido.
Onde ocorrem as negociações?
As negociações têm lugar em Bruxelas.
Quando é que o Reino Unido deixa de ser membro da União Europeia?
Os Tratados deixam de ser aplicáveis ao Reino Unido a partir da data de entrada em vigor do acordo ou, na falta deste, dois anos após a notificação da retirada. O Conselho pode decidir por unanimidade prorrogar esse prazo.
Até à retirada, o Estado-Membro continua membro da União Europeia, com todos os direitos e obrigações daí decorrentes, incluindo o princípio da cooperação leal, segundo o qual a União e os Estados-Membros devem prestar-se assistência mútua na aplicação do Tratado.
O que acontece se não for alcançado um acordo?
Os Tratados da UE deixarão simplesmente de ser aplicáveis ao Reino Unido dois anos após a notificação.
Um Estado-Membro pode solicitar uma nova adesão após a saída?
Qualquer país que se tenha retirado da União pode solicitar uma nova adesão. Para esse efeito, terá de iniciar um novo processo de adesão.
O acionamento do artigo 50 pode ser revogado?
Compete ao Reino Unido acionar o artigo 50. No entanto, uma vez ativado não pode ser unilateralmente retirado. A notificação é irreversível na medida em que o artigo 50.º não prevê a retirada unilateral da notificação.
O que diz o artigo 50?
Artigo 50 do Tratado da União Europeia (TUE).
- Qualquer Estado-Membro pode decidir, em conformidade com as respetivas normas constitucionais, retirar-se da União.
- Qualquer Estado-Membro que decida retirar-se da União notifica a sua intenção ao Conselho Europeu. Em função das orientações do Conselho Europeu, a União negocia e celebra com esse Estado um acordo que estabeleça as condições da sua saída, tendo em conta o quadro das suas futuras relações com a União. Esse acordo é negociado nos termos do n.º 3 do artigo 218º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia. O acordo é celebrado em nome da União pelo Conselho, deliberando por maioria qualificada, após aprovação do Parlamento Europeu.
- Os Tratados deixam de ser aplicáveis ao Estado em causa a partir da data de entrada em vigor do acordo de saída ou, na falta deste, dois anos após a notificação referida no n.º 2, a menos que o Conselho Europeu, com o acordo do Estado-Membro em causa, decida, por unanimidade, prorrogar esse prazo.
- Para efeitos dos números 2 e 3, o membro do Conselho Europeu e do Conselho que representa o Estado-Membro que pretende retirar-se da União não participa nas deliberações nem nas decisões do Conselho Europeu e do Conselho que lhe digam respeito. A maioria qualificada é definida nos termos da alínea b) do n.º 3 do artigo 238º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
- Se um Estado que se tenha retirado da União voltar a pedir a adesão, é aplicável a esse pedido o processo referido no artigo 49º.