O Governo português atribuiu Medalha de Mérito Cultural à cantora brasileira Maria Bethânia. O Governo justifica a distinção como sinal de gratidão pelo inestimável trabalho que tem feito na divulgação dos poetas portugueses, declamando-os, cantando-os e contribuindo de forma ímpar para a sua popularização não só no Brasil como em diversas partes do mundo.
A cerimónia de entrega da Medalha de Mérito Cultural, presidida pelo ministro da Cultura, teve lugar ontem à noite, em Oeiras, no término do concerto da artista inserido no festival Jardins do Marquês. Pedro Adão e Silva destacou a “ideia verdadeiramente luminosa de Maria Bethânia fazer dos poetas artistas populares”.
Maria Bethânia nasceu em Santo Amaro da Purificação, no estado da Bahia, a 18 de junho de 1946, a mais nova dos seis filhos de Dona Canô e de José Teles Veloso. Aos 14 anos, muda-se para Salvador, para estudar, e é lá que em 1963 faz a sua estreia como cantora, na peça “Boca de Ouro”, de Nelson Rodrigues. No ano seguinte, participa no espetáculo “Nós, Por Exemplo”, ao lado do seu irmão Caetano Veloso, de Gal Costa, de Gilberto Gil e de Tom Zé, na inauguração do Teatro Vila Velha, em Salvador. A sua carreira adquire projeção nacional, no Brasil, quando em janeiro de 1965 substitui Nara Leão – a convite desta – no histórico espetáculo “Opinião”, no Rio de Janeiro. A ditadura militar brasileira, que havia de durar duas décadas, estava então no seu início. A música de protesto “Carcará” foi o primeiro grande sucesso de Maria Bethânia.
Desde o primeiro LP, publicado em 1965, Bethânia lançou dezenas de álbuns, tanto gravados em estúdio quanto ao vivo, e tem estabelecido incontáveis parcerias com nomes marcantes da música brasileira e internacional. Entre todas, talvez mereça destaque a colaboração íntima com Caetano Veloso, Gal Costa e Gilberto Gil, com quem em 1976 fez o projeto “Doces Bárbaros”, apresentando-se em digressão pelo Brasil para assinalar os dez anos de carreira dos quatro músicos baianos. Mas a esta parceria têm de ser acrescentados muitos outros discos e espetáculos – com Edu Lobo, Chico Buarque, Vinícius de Moraes, Toquinho, Milton Nascimento, João Gilberto, Paulinho da Viola, Dona Ivone Lara, Margareth Menezes, João Bosco, Alcione, Hermeto Pascoal, Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Omara Portuondo, Joan Manuel Serrat, ou Luciano Pavarotti, entre uma infinidade de outros. É injusto destacar alguns, mas é impossível enumerar todos.
Como talvez nenhuma outra intérprete fora de Portugal, Maria Bethânia cultivou desde sempre uma relação muito estreita com a poesia portuguesa, desempenhando um papel incomparável na sua divulgação. Gravou autores como Sá de Miranda (“Comigo me desavim”, título de um seu espetáculo de 1968), José Régio (“Cântico Negro”, incluído no álbum “Nossos Momentos”, de 1982), ou Manuel Alegre (“Senhora do Vento Norte”, no álbum “Diamante Verdadeiro”, de 1998), e dedicou álbuns inteiros a Fernando Pessoa (“Imitação da Vida”, de 1997) e a Sophia de Mello Breyner Andersen (“Mar de Sophia”, de 2006).
A sua obra tem sido amplamente reconhecida, pelo público e pela crítica. A Universidade Federal da Bahia atribuiu-lhe em 2016 o Doutoramento Honoris Causa, pelo contributo dado para a Música Popular Brasileira. Nesse mesmo ano, a escola de samba da Mangueira prestou-lhe homenagem, desfilando com o enredo “Maria Bethânia: a Menina dos Olhos de Oiá”.
Em Portugal, o Presidente da República agraciou-a com o grau de Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, a 26 de novembro de 1987; dez anos depois, a 18 de agosto de 1997, receberia o grau de Comendadora da mesma Ordem. A Câmara Municipal de Lisboa distinguiu-a com a Medalha de Mérito Municipal, a 7 de junho de 2011. A artista recebeu ainda, em março de 2010, a medalha da Ordem do Desassossego, homenagem da Casa Fernando Pessoa pelo seu papel na divulgação da obra do poeta português.
Agora e em sinal de reconhecimento e gratidão pelo inestimável trabalho que tem feito em prol da música e da língua portuguesa – com destaque para a divulgação da poesia de autores portugueses, não só no Brasil mas nas mais diversas partes do mundo – o Governo Português prestou pública homenagem a Maria Bethânia, atribuindo-lhe a Medalha de Mérito Cultural.