Há mais de um século, que os neurocientistas sabem que as células nervosas comunicam umas com as outras através dos pequenos espaços entre elas, um processo conhecido como transmissão sináptica (as sinapses são conexões entre os neurônios).
A informação é transportada a partir de uma célula para a outra por neurotransmissores, como o glutamato, a dopamina e a serotonina, que ativam os recetores no neurónio recetor para transmitir mensagens excitativas ou inibitivas.
Mas para além do esquema básico conhecido, os detalhes de como a função cerebral ocorre permaneceram, até agora, sem ser descritos, refere a University of Maryland School of Medicine (UM SOM), em comunicado. Mas uma nova investigação levada a cabo por cientistas da referida Universidade vem, pela primeira vez, descrever detalhes sobre a arquitetura do processo de neurotransmissão. O estudo já se encontra publicado na revista científica ‘Nature’.
Sinapses são máquinas moleculares muito complexas e minúsculas, com apenas alguns milionésimos de polegada de diâmetro. O cérebro possui cerca de 100 triliões de sinapses, e cada uma é individualmente e precisamente sintonizada para transmitir sinais mais fortes ou mais fracos entre as células.
Para visualizar os recursos nesta escala submicroscópica os investigadores utilizaram uma tecnologia inovadora conhecida por ‘single-molecule imaging’, que pode localizar e acompanhar o movimento de moléculas individuais de proteínas dentro dos limites de uma única sinapse, mesmo em células vivas, refere a UM SOM.
Utilizando esta abordagem, os cientistas identificaram de forma precisa um padrão inesperado no processo de neurotransmissão, quando analisaram as sinapses de rato em cultura. Em termos de estrutura geral as sinapses de rato são muito semelhantes às sinapses humanas, indicam os cientistas.
Thomas Blanpied, do Departamento de Fisiologia da UM SOM, e líder da equipa de cientistas envolvida na investigação, citado no comunicado, disse: “Nós estamos a ver coisas que nunca tinham sido vistas. Esta é uma área totalmente nova de investigação”.
O investigador acrescentou: “Durante muitos anos, nós tivemos uma lista dos muitos tipos de moléculas que se encontram em sinapses, mas isso não nos levou mais longe na compreensão de como as moléculas se encaixam, ou como o processo realmente funciona estruturalmente”. Agora com recurso à tecnologia ‘single-molecule imaging’ “que permite mapear muitas das principais proteínas, finalmente fomos capazes de revelar a estrutura arquitetónica principal da sinapse”.
No artigo publicado na revista científica ‘Nature’, Thomas Blanpied descreve um aspeto desta arquitetura que pode explicar porque as sinapses são tão eficientes, mas também suscetíveis de disrupções durante uma doença. Em cada sinapse, as proteínas-chave são organizadas de forma muito precisa no intervalo entre as células.
Thomas Blanpied refere: “Os neurônios fazem um trabalho muito melhor do que imaginávamos ao posicionarem a libertação de moléculas neurotransmissoras perto de seus recetores”, e “as proteínas nos dois neurónios diferentes estão alinhadas com uma precisão incrível, formando quase uma coluna que se estende entre as duas células”.
Para os investigadores, esta proximidade das moléculas otimiza o poder de transmissão, e também sugere que estas novas formas de transmissão podem ser modificadas. Assim, consideram que a compreensão desta arquitetura irá ajudar a esclarecer como funciona a comunicação dentro do cérebro, ou, no caso de doença psiquiátrica ou neurológica, como a estrutura deixa de funcionar.
Mas Thomas Blanpied também está centrado em investigar a atividade de ‘moléculas de adesão’, que se estendem de uma célula a outra e podem ser peças importantes da ‘nano-coluna’.
O investigador suspeita que, se as ‘moléculas de adesão’ não estão posicionadas corretamente na sinapse, a arquitetura sináptica será interrompida, e os neurotransmissores não serão capazes de fazer seu trabalho.
No caso de alguns transtornos, o investigador considera que o cérebro mesmo tendo uma quantidade certa de neurotransmissores, as sinapses não transmitem essas moléculas de forma eficiente.
Para Thomas Blanpied, uma melhor compreensão da arquitetura sináptica, pode levar a uma melhor compreensão das doenças cerebrais, como a depressão, a esquizofrenia e a doença de Alzheimer, e talvez poder levar a novas ideias de tratamentos, pelo que estão agora a investigar se a arquitetura sináptica muda em determinadas doenças.