A forma natural de uma gota de água é esférica e não do tipo ‘cebola’ como a que é muitas vezes representada, quando em queda livre, lembram investigadores da Universidade de Aveiro envolvidos num estudo sobre buracos negros. A gota de água é uma esfera perfeita tal como é a de um buraco negro mais simples.
Os investigadores Carlos Herdeiro e Eugen Radu do Departamento de Física da Universidade de Aveiro esclareceram que se a uma gota de água for acrescentada uma carga elétrica, então a gota esta pode adquirir novas formas, e o mesmo pode acontecer a um buraco negro. Esta descoberta da equipa de físicos de Aveiro mostrou que “os buracos negros quando sujeitos a cargas elétricas podem comportar-se de uma maneira semelhante à das gotas de água.”
Ao longo do tempo os estudos têm apontado para semelhanças entre o comportamento da familiar gota de água e o comportamento de um buraco negro, que é uma região do espaço-tempo da qual a luz não consegue escapar.
Em 1879 o físico britânico Lord Rayleigh, prémio Nobel da física de 1904 pela descoberta do gás nobre Árgon, “demonstrou que uma gota de água, isolada de forças externas (incluindo do campo gravítico) tem uma forma esférica.”
Os investigadores indicam que Rayleigh demonstrou também que a forma da gota é estável, mas se a gota for ligeiramente perturbada, a forma “oscila um pouco e retorna novamente à forma esférica.”
Rayleigh, em 1892, obteve outro resultado fundamental em dinâmica de fluidos, lembram os investigadores de Aveiro. “Se a gota tiver carga elétrica, pode continuar esférica, mas se a carga exceder um certo limiar, o denominado limite de Rayleigh, a gota deixa de ter preferência pela forma esférica.”
A conclusão é de que se a gota for um pouco perturbada, esta desvia-se da forma esférica, assim, as gotas com carga elétrica que exceda o limite de Rayleigh podem adquirir novas formas não esféricas, que são mais estáveis – porque minimizam a repulsão entre as cargas elétricas – do que no caso de uma esfera perfeita.
“Tal como uma gota de água neutra (sem rotação), um buraco negro em equilíbrio tem de ser esférico e esta é a sua forma mais estável. Mas a semelhança entre a gota de água e o buraco negro não tinha continuidade se introduzíssemos carga elétrica”, explicou Carlos Herdeiro, citado em comunicado da Universidade de Aveiro.
Carlos Herdeiro, coordenador do estudo já publicado na revista Physical Review Letters, esclareceu ainda que “a gota de água carregada apenas prefere ser esférica até ao limite de Rayleigh, e que o buraco negro com carga elétrica parecia preferir sempre ser esférico”.
O estudo, de que é também autor Eugen Radu, e que envolveu ainda colaboração de dois investigadores da Universidade de Valência, em Espanha, mostrou que, “buracos negros carregados podem-se comportar de uma maneira muito semelhante a uma gota de água com carga elétrica.”
O estudo com o título “Spontaneous scalarisation of charged black holes”, no âmbito da física e matemática, mostrou que, tal como a gota de água, os buracos negros com carga elétrica apenas são esféricos até um determinado limiar de carga, e Carlos Herdeiro indicou: “A partir desse limiar, outras formas não esféricas tornam-se possíveis, e até preferenciais, exatamente como no caso das gotas carregadas.”
No estudo, os investigadores utilizaram a interação entre campo eletromagnético e outras partículas, para determinarem o novo comportamento de buracos negros carregados eletricamente. Um procedimento que Carlos Herdeiro explicou: “Quanto esta interação é considerada, surge um novo “canal” para o buraco negro se aliviar da repulsão entre as suas cargas elétricas, ao criar uma nuvem de partículas carregadas em seu redor.”
O investigador acrescentou que a nuvem “pode tomar várias formas geométricas não esféricas, e como contém uma parte considerável da energia do buraco negro, a forma do buraco negro, que é determinada pela forma da fronteira deste – denominado por horizonte de acontecimentos – adapta-se à forma da nuvem, deixando o buraco negro de ser esférico”.
Os investigadores mostraram no estudo que os buracos negros não esféricos existem, e que “a transferência de energia e carga elétrica do buraco negro para a nuvem de partículas em seu redor pode ocorrer dinamicamente e espontaneamente.”