Manuel Heitor, Ministro da Ciência, Tecnologia, e Ensino Superior, abriu a conferência ‘Caminhos do Conhecimento’ lembrando o que Mariano Gago escreveu: “Investir na Ciência é investir no futuro. Ciência é conhecimento, organizado e verificado, sistematizado e questionável, aberto à crítica e ao progresso, assente na profundidade do conhecimento anterior”.
Posicionando-se no tema central da conferência, ‘cultura científica’, Manuel Heitor referiu que “pensar cultura científica em Portugal exige, naturalmente, evocar o legado de José Mariano Gago”, e acrescentou, um legado que nos leva “a rever o nosso percurso democrático de procura do conhecimento, assim como o projeto de construção europeia”.
“Nos anos 90, José Mariano Gago mostrou que o debate sobre cultura científica era, sobretudo, um debate político e uma luta política”, referiu Manuel Heitor, acrescentando que também nos mostrou que “o debate, pela sua própria natureza, é mal adaptado ao jogo efémero da política de escolhas”.
“Ainda hoje não é evidente que a educação científica de base, para todos, é uma condição essencial para empregabilidade futura e, além disso, da cidadania, servindo para informar a escolha e votos”, o que mostra a complexidade da discussão política sobre cultura científica.
A ligação ou dependência entre educação científica e formação de cultura científica continua a não assentar num facto reconhecido, referindo Manuel Heitor que “o facto da educação científica dever ter como alicerce os critérios da formação de cultura científica não é óbvia”.
Heitor indica que a falta de consistência da dependência entre educação e cultura científica “resulta da ausência das consequências banais e duradouras que seria a sua sequência natural: a generalização da experimentação no ensino das ciências; a educação científica ‘ao vivo’ desde o nível da escola primária; as parcerias sistemáticas entre as escolas, as instituições científicas, e os museus ou centros de divulgação de informação”.
A educação científica não é uma questão de escolha para um momento e para um tempo curto de ação política, não “pode ser prontamente incorporada no período normal de duração das legislaturas, e ainda menos das campanhas eleitorais. Pelo contrário, requer profundidade no combate, aparentemente sem adversários, sem metas, e sem prazos”.
Nos anos 90, Mariano Gago escreveu que a luta da cultura científica só poderia ser especificada e percebida através do combate ao isolamento social da ciência, lembrou Manuel Heitor. Um isolamento também gerido pelas “barreiras estruturais entre a ciência e a população em geral”.
Heitor lembrou os esforços de Mariano Gago, de John Ziman, e de Joan Solomon, (…) entre muitos outros que levaram à construção de duas linhas de ação, sobre ciência, educação e cultura científica, à escala europeia.
Uma das linhas de ação que envolvia “a reflexão e a investigação foi conduzida com maior profundidade, sobretudo nas áreas de comunicação de ciência e das ciências sociais, apesar das ciências políticas e das ciências económicas não terem ainda sido capazes de reunir esforços consideráveis para trabalhar nas dimensões políticas e económicas da educação da ciência e da cultura científica”.
Outra das linhas de ação consistiu em programas concretos de promoção da cultura científica na Europa, que conduziram à construção de modelos como o ‘Ciência Viva’ em Portugal e o ‘La Main à la Pâte’ em França. Estes modelos trouxeram “a ciência real para o universo concreto de oportunidades de aprendizagem para a maioria dos jovens, particularmente no ensino primário e em outros níveis de escolaridade básica”.
Manuel Heitor frisou que “o lugar essencial da experimentação, a colaboração entre escolas e instituições tecnológicas e científicas, e o uso das tecnologias de informação e comunicação são elementos necessários de tal ação política coletiva em que todos somos hoje convidados a participar”.
Para o Ministro da Ciência é possível em Portugal falar do ‘efeito Ciência Viva’ para explicar, no seu entendimento, “o aumento considerável da fração dos jovens (no ensino secundário) que optaram pelas áreas científicas desde 1996 e após a introdução de práticas de ensino experimental das ciências nas escolas”.
Mas no tempo “cada geração deve ser capaz de explorar novas realidades e ter as oportunidades para o efeito”, indicou Manuel Heitor, e acrescentou: “precisamos de continuar a incentivar a cultura científica e o ensino experimental das ciências nas nossas escolas e em todas as escolas do pré-escolar ao ensino superior”.
Heitor lembrou o que Mariano Gago referiu a respeito das novas realidades, ou seja, “que num contexto de crescente e contínuas mutações sociais, económicas e tecnológicas, a reivindicação para a promoção da inovação deve ser compreendida sobretudo em termos do processo de aprendizagem, e não apenas num inventário de matérias ou de prioridades, nem muito menos em rankings e métricas que ignoram o conteúdo do processo de aprender e criar”.
Neste contexto, “mais importante que especificar de intervenção, interessa compreender como promover competências, sobretudo no que respeita à necessidade de conciliar o desenvolvimento de competências ‘nucleares’ em matérias tradicionais, com competências em tecnologias de informação, competências sociais e com o estimular da capacidade de aprender, apreender e empreender”.